segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Magia dos brinquedos pode nascer das sobras
DENISE RIBEIRO
Colaboração para a Folha

O Brasil é rico em diversidade de costumes, em criatividade e em vontade de muita gente em transformar sucata em produtos rentáveis. Restos de tecido, botões quebrados, fibras naturais e sobras de caixote reciclados por mãos bem treinadas viram lindos brinquedos. Conheça a experiência de cinco comunidades (duas no Pará, duas no Distrito Federal e uma em São Paulo) que passaram a viver dias melhores depois de comercializar seus brinquedos feitos de material reciclado. Quatro delas contaram com parceria do Sebrae.

Roberto Assunção/Folha Imagem

Bonecas na novela

Elas ficaram famosas recentemente, assim que a novela Bang Bang (Rede Globo) entrou em cartaz. Nos cenários divertidos da novela, as bonecas de pano produzidas pela Sonho de Pano ganharam destaque, conquistando a simpatia dos atores e da audiência. A grife faz parte da Associação Mulheres em Ação, sediada no Varjão, na periferia de Brasília, e presidida por Maria Anita da Silva, 46. "Quem coordena o trabalho todo é a psicóloga Soraia Melo, que foi quem começou o trabalho com as mulheres da região, em 2002, com o apoio do Sebrae, que é um dos doadores dos retalhos", explica Maria Anita.

Atualmente, são 200 as associadas que se dedicam com paciência à arte de confeccionar bonecas. "É um trabalho que requer muita paciência e cuidado, mas funciona como terapia. Além disso, nossa qualidade de vida melhorou, principalmente porque é possível às mães ganharem um dinheirinho estando junto dos seus filhos. Esse era nosso principal objetivo: melhorar a renda sem ter de sair de perto das crianças", ressalta a artesã.

Aos poucos, o dia-a-dia da comunidade do Varjão vai melhorando, com o trabalho e o esforço conjunto das mulheres. No momento, estão todas ocupadíssimas, correndo para dar conta de suprir com suas bonecas as prateleiras de lojas e em exposições.

Associação Mulheres em Ação
Brasília (DF)
Quanto custa? de R$ 5 (menores) a R$ 40 (bordadas)
Encomendas: 0/xx/61/3468-4580

Roberto Assunção/Folha Imagem

Miriti na França

Os brinquedos de miriti, uma fibra leve de palmeira conhecida como isopor da Amazônia, são fabricados há 200 anos no Pará. Mas nunca haviam sido valorizados no Estado, onde só brilhavam em outubro, durante os festejos do Círio de Nazaré. A história mudou há dois anos, quando o Sebrae instalou um projeto de capacitação de artesãos em Abaetetuba, município a 120 km de Belém e principal pólo de brinquedos de miriti. Hoje, eles têm pontos de venda no Rio e em São Paulo e ganharam o mundo, depois de ter participado no ano do Brasil na França, levados por Valdeli Costa, um dos 108 integrantes da Associação dos Artesãos de Brinquedos de Miriti de Abaetetuba (Asamab). "Vendemos as 2 400 peças disponíveis. Em Paris, fiz uma oficina de brinquedo, que foi muito visitada. Eu estou muito feliz, construí minha casa e estou mantendo meus quatro filhos na escola só com os brinquedos de miriti", comemora Valdeli, que tem oito anos de ofício.

Agora, ele fundou a Miritong, uma ONG para dar vazão à veia criativa dos artesãos mais jovens, além de outras iniciativas, como papel de fibras naturais e atividades como dança, música e teatro. "Havia conflito de idéias com os mais velhos e estamos tendo resultados muito positivos. Alguns jovens que eram envolvidos com drogas agora se encontraram, fazendo brinquedo", diz Valdeli, com a experiência de quem já foi dependente de álcool.

Associação dos Artesãos de Brinquedos de Miriti de Abaetetuba
Abaetetuba (PA)
Quanto custa? de R$ 5 a R$ 10
Encomendas: 0/xx/91/3751-1895; ou por e-mail adilson@pa.sebrae.com.br

Roberto Assunção/Folha Imagem

Brinquedos cabanos

O que fazer com caixotes de madeira que serviam para embalagem? Esses resíduos de madeira, que antes iam para o lixo, são agora fonte de renda para uma comunidade em Barcarena, distrito industrial no Pará. A empresa que os produzia, a Albras (Alumínio Brasileiro), associou-se a uma cooperativa e fundou há um ano uma fábrica de brinquedos que hoje garante renda, ocupação e auto-estima para 16 dos 238 cooperados. Os brinquedos Cabanos, cujo nome homenageia a revolta popular ocorrida no Pará há cerca de 170 anos, tem licença ambiental e função educativa.

Tem, também, um mérito maior: o de ter conseguido motivar pessoas desiludidas por longos períodos de desemprego. "Ninguém ganha menos que o salário-mínimo. O Sebrae contratou assessores para capacitar o grupo a fabricar brinquedos. Eles ficaram tão exímios que já ganhamos a certificação do Inmetro", comemora a assistente social Vera Lucia Campos Germano, coordenadora de projetos da Associação Copsai (Cooperativa de Serviços Agroflorestais e Industriais).

No início, a produção era de 500 peças ao mês. Hoje, são até 2.500 unidades. A variedade também é grande: há 14 modelos de brinquedos, como relógio, tangran (um jogo chinês) e bate-pino, até minisofás e guarda-roupas. E tem mais: a serragem que sobra dos Brinquedos Cabanos serve para alimentar o forno de farinha de uma comunidade de pequenos agricultores. Isso é que é reciclagem!

Associação Cooperativa de Serviços Agroflorestais e Industriais
Barcarena (PA)
Quanto custa? de R$ 5,90 a R$ 70 reais
Encomendas: 0/xx/91/3754-6562/3754-6453 ou pelo site coopsai@amazon.com.br

Roberto Assunção/Folha Imagem

Livros na Inglaterra

O álcool e as drogas, que consumiam a vida de muitas mães de seus alunos, foram o mote para as irmãs Mirtes e Marly de Souza fundarem, há 21 anos, o Movimento de Mulheres do Jardim Comercial, bairro próximo do Capão Redondo, na periferia de São Paulo. Na primeira semana, eram dez mulheres, depois de um mês, 100, costurando à luz de velas, porque a energia elétrica era muito cara. "Em um ano passaram a 1.000 e hoje atendemos a 3.000 mulheres, sem ajuda de nenhum órgão público ou privado", conta Mirtes, a presidente do movimento, realizada porque ajudou a livrar as dependentes de seus vícios.

Graças a esse trabalho de formiguinha, mulheres que antes não tinham a menor perspectiva de obter renda agora ensinam outras a tirar seu sustento do artesanato em tecido. Elas bordam histórias, criam livros e jogos caprichados e coloridos. E eles já estão povoando escolas na Inglaterra e estiveram num pavilhão de artesanato brasileiro na França, em dezembro.

A produção de livros chega a 200 unidades/mês e a de jogos, a 300. Os brinquedos do grupo são comercializados em feiras e bazares e eventualmente vendidos por encomendas para empresas. Todos os domingos também é possível encontrar representantes da ONG em barraquinhas montadas em feiras artesanais de dois shoppings em São Paulo: no Center 3 e no D&D. Além dos brinquedos, marcadores de livros, cartões de Natal em tecido e trabalhos em patchwork compõem a linha de criação do grupo, que está aberto a doações de algodão cru, manta acrílica, linhas para bordar, renda e aviamentos em geral.

Movimento de Mulheres do Jardim Comercial
São Paulo (SP)
Quanto custa? de R$ 5 a R$ 30 reais
Encomendas: 0/xx/11/5823-1641 ou pelo e-mail mirsouza@yahoo.com.br

A Ginga do Fuxico

Sobras de popeline, seda e viscose, bolsos de calças jeans, restos de linha e miçangas, pedaços de garrafas Pet, botões quebrados. Todo esse material se transforma em lindos brinquedos artesanais, feitos por bordadeiras, crocheteiras, artesãs de "biscuit" e catadores de lixo do Distrito Federal. São jogos da memória e da velha, cinco marias, dedotes que viram personagens e historinhas em painéis. O grupo, chamado Fuxicando, é coordenado pela artesã Claudia Fernandes Lima Canabravas, 50, mãe de quatro filhos e uma apaixonada pelo que faz. "Costuro desde menina e tinha o sonho de transformar a realidade dessas pessoas. Por isso, quando terminou a oficina patrocinada pelo Sebrae, na qual eu era instrutora, resolvi continuar o trabalho por minha conta", recorda.

Isso foi em março de 2002. Desde então, ela coordena a criação e a produção de cerca de 40 alunos, que começaram tateando tecidos e agulhas e hoje se orgulham de ser artesãos. Claudia vibra com a transformação: "Sou privilegiada, porque os produtos são lindos, mas chegar ao produto é muito mais bonito. As pessoas ganham auto-estima e aprendem a obedecer sem ter de se submeter. Não tem essa história de cesta básica. São todos remunerados de acordo com uma tabela de hora trabalhada feita em conjunto com elas. O índice de doenças no grupo caiu a zero. Acabou gripe, dor de cabeça, de garganta. Quando você é valorizado pelo que faz, não tem tempo pra besteira, cumpre o horário e produz direito para melhorar a renda".

O Fuxicando, que em 2003 não tinha dinheiro para nada, começou a se projetar no ano passado e, neste ano, ganhou ânimo redobrado depois de fechar um contrato com a Tok-Stok, para panos de prato e jogos americanos. Para fechar encomendas de brinquedos, a instituição depende de dinheiro para o processo de aprovação das peças pelo Inmetro.

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